"A região da África subsaariana está bem posicionada para beneficiar do aumento da procura do seu gás, num contexto em que a Europeia procura fontes seguras de energia, devido às tensões agravadas na Rússia e Ucrânia", lê-se numa análise às implicações do conflito. De acordo com a nota enviada aos investidores, e a que a Lusa teve acesso, "os novos projetos de gás natural liquefeito em Moçambique e na Nigéria vão liderar o crescimento da produção na África subsaariana, com muitos acordos de longo prazo a já estarem assinados com compradores fora da Europa, principalmente na Ásia.
No comentário desta consultora detida pelos mesmos donos da agência de notação financeira Fitch Ratings, os analistas escrevem que "a crise energética europeia deu um renovado otimismo" para os grandes projetos africanos, como na Tanzânia ou em Moçambique, já que "os mercados na Europa estão urgentemente a procurar diversificar as suas fontes de energia face à dependência do gás russo, cujos preços subiram significativamente nos últimos meses".
Em 2020, a russa Gazprom forneceu mais de 174 mil milhões de metros cúbicos (bcm) de gás à Europa, o que equivale a mais de 15% da procura gasista nesse ano, com a Alemanha, Itália e Áustria a serem dos maiores importadores de gás russo.
A produção de gás na África subsaariana "deverá aumentar nos próximos anos e passar de 79 bvm, em 2021, para 149 bcm em 2031, com Moçambique e Nigéria a contribuírem com aproximadamente 78,6% da produção regional no final desta década", salientam os analistas.
Moçambique está a preparar-se para ser um dos principais exportadores de gás a nível mundial, quando o projeto Coral FNLG arrancar, provavelmente no segundo semestre deste ano, mas a produção moçambicana só deverá aumentar exponencialmente a partir de 2026, partindo do princípio de a situação de segurança no norte do país se estabiliza.
A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que já causou pelo menos 691 mortos e mais de 1.140 feridos, incluindo algumas dezenas de crianças, e provocou a fuga de cerca de 4,8 milhões de pessoas, entre as quais três milhões para os países vizinhos, segundo os mais recentes dados da ONU.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas a Moscovo.
Moçambique tem três projetos de desenvolvimento aprovados para exploração das reservas de gás natural da bacia do Rovuma, classificadas entre as maiores do mundo, ao largo da costa de Cabo Delgado.
Dois desses projetos têm maior dimensão e preveem canalizar o gás do fundo do mar para terra, arrefecendo-o numa fábrica para o exportar por via marítima em estado líquido.
Um é liderado pela TotalEnergies (consórcio da Área 1) e as obras avançaram até à suspensão por tempo indeterminado, após um ataque armado a Palma, em março.
O outro é o investimento ainda sem anúncio à vista liderado pela ExxonMobil e Eni (consórcio da Área 4).
Um terceiro projeto quase concluído e de menor dimensão pertence também ao consórcio da Área 4 e consiste numa plataforma flutuante que vai captar e processar o gás para exportação, diretamente no mar, com arranque marcado para 2022.
A plataforma flutuante deverá produzir 3,4 mtpa (milhões de toneladas por ano) de gás natural liquefeito, a Área 1 aponta para 13,12 mtpa e o plano em terra da Área 4 prevê 15 mtpa.
A província de Cabo Delgado é aterrorizada desde 2017 por rebeldes armados, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
O conflito já provocou mais de 3.100 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e mais de 817 mil deslocados, de acordo com as autoridades moçambicanas.
Desde julho, uma ofensiva das tropas governamentais com o apoio do Ruanda, a que se juntou depois a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), permitiu aumentar a segurança, recuperando várias zonas onde havia presença de rebeldes, nomeadamente a vila de Mocímboa da Praia, que estava ocupada desde agosto de 2020.